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Bolsonaro deixa Enem com licitação atrasada e escassez de questões

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O governo de Jair Bolsonaro (PL) deixa entre as heranças para a futura gestão problemas que marcaram o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) nos últimos quatro anos: escassez de questões e atraso na licitação com a empresa responsável pela aplicação da prova.

Para servidores do Inep, órgão responsável pelo exame, o governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) precisará agir rápido para evitar o risco de apagão do principal meio de acesso às vagas das universidades públicas.

A operação para colocar o Enem de pé é complexa e leva tempo. A produção de questões e o planejamento dos custos, além das licitações, por exemplo, precisam acontecer antes mesmo da última edição ser finalizada. No caso do exame 2023, há processos que precisam ser feitos ainda nos próximos meses —enquanto as provas do Enem 2022 são corrigidas e os resultados, divulgados.

Nos últimos anos, por exemplo, o governo deixou de lado processos importantes como a atualização do BNI (Banco Nacional de Itens). Desde o ano passado, servidores do órgão avisam sobre a escassez de perguntas para o exame.

Ao UOL, o Inep afirmou que tem promovido “ações estruturantes a fim de garantir a sustentabilidade do BNI a médio prazo”. O órgão garantiu que a previsão do edital de licitação deve ocorrer ainda em 2022.

“Qualquer informação sobre a entrada de itens novos é de caráter sigiloso, não podendo ser fornecida, como forma de não colocar em risco futuras edições do exame”, explicou o órgão. A reportagem também procurou a equipe responsável pela área de educação no governo de transição de Lula, mas não obteve resposta.

No limite do limite. Uma das principais tarefas envolvendo o Enem para os próximos anos é iniciar um processo licitatório para a empresa responsável pela aplicação do exame. Neste ano, o Inep atrasou essa etapa e precisou fazer um sétimo termo aditivo do contrato com a Fundação Cesgranrio e com a FGV (Fundação Getúlio Vargas), que formam o consórcio responsável pela aplicação do Enem.

Aditivo em vez de licitação. Conforme mostrou o UOL, o instituto chegou a pedir uma análise da Procuradoria-Geral Federal sobre a regularidade jurídica do aditivo. A razão é que o contrato com o consórcio estabelecia a possibilidade de renovação por 60 meses —de julho de 2017 até julho de 2022. Apesar de alertas de servidores, o instituto optou pelo aditivo e não fez a licitação.

A reportagem teve acesso a um documento em que o então presidente do Inep, Danilo Dupas, afirma que tomou “providências” para entender o atraso no andamento do processo licitatório.

É ilegal? Decidir criar um aditivo após o fim do contrato não é considerada uma medida ilegal, segundo professores consultados pela reportagem. Servidores do instituto ouvidos pelo UOL na condição de anonimato afirmam, no entanto, que a decisão pode acarretar em mais gastos pelo serviço de aplicação do Enem.

A cada renovação do contrato, o governo federal deve reajustar o valor pago com atividades extras, se houver necessidade, e corrigir com a inflação. Com a licitação, a vencedora teria o menor preço.

A reportagem apurou que o processo de licitação para aplicação da prova nos próximos anos está sob análise da área jurídica do Inep. Em nota enviada ao UOL, o instituto afirmou que processo está em análise pela Procuradoria Federal.

“Após o parecer jurídico, a DGP (Diretoria de Gestão e Planejamento) realizará os ajustes indicados, caso ocorram, para publicação do edital em seguida”, afirmou o Inep.

O que faz o consórcio aplicador do Enem? As atividades do consórcio começam bem antes dos dias da prova. As empresas, por exemplo, organizam a divisão dos participantes nos locais de aplicação do exame.

O consórcio também é responsável por receber e depois entregar os malotes de prova. A contratação de funcionários para os locais do exame fica a cargo das empresas.

Banco de itens em frangalhos. Outro processo custoso e longo que deve ser priorizado nos próximos anos é a atualização do banco de questões do Enem. Para edição deste ano, foi possível fazer uma prova apenas com itens inéditos, mas nem todas passaram por pré-testes —conforme prevê o protocolo do Inep.

Nas palavras de um servidor foi preciso “raspar o tacho” para fazer a montagem do Enem 2022. Professores de cursinhos avaliaram que muitas questões não estavam equilibradas. Na avaliação dos educadores, havia perguntas muito fáceis e outras muito difíceis.

O excesso de texto também foi apontado por eles como um possível problema da escassez de perguntas.

Procurado pela reportagem, o Inep afirmou que tem ações em andamento desde 2021 para atualizar o BNI —o UOL apurou que apenas novas questões foram feitas de lá para cá, mas sem pré-testes.

O ineditismo das questões no Enem é um critério do Inep que foi aplicado em todas as edições, inclusive em 2022, e não será alterado. Portanto, o instituto reafirma seu compromisso de elaborar o instrumento de avaliação do Enem somente com itens inéditos nas futuras edições.”
Inep sobre a atualização do banco de questões

O caminho das questões. O UOL mostrou que, para qualquer questão ser incluída no Enem, precisa fazer parte do BNI. Para isso, a pergunta precisa ser elaborada, revisada, e, depois, testada.

Nenhum item foi produzido nos três primeiros anos de governo e o último pré-teste foi feito em 2019. Estima-se que o processo de inclusão de cada questão custe entre R$ 2.000 e R$ 3.000.

Enem 2022. A edição deste ano foi aplicada nos últimos domingos, 13 e 20 de novembro. Quase 3,4 milhões de candidatos se inscreveram para fazer o exame.

A prova ficou marcada por abordar questões sociais como desigualdade educacional, fome, feminismo e racismo.

Pelo quarto ano consecutivo, no entanto, o Enem não apresentou nenhuma pergunta sobre ditadura militar —o tema sempre apareceu no exame antes do governo Bolsonaro.

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